Bola pra frente
Desistir de uma prova não é o fim do mundo
O psicólogo esportivo Rob Udewitz, de Nova York, teria oito maratonas no cangote (e não sete) se não tivesse abandonado a badalada prova de sua cidade em 1998. O que ele aprendeu com a experiência pode ajudar você.

Seja realista: Entre na competição com uma atitude positiva, mas saiba que não terminar a prova é uma possibilidade. Se você entender que esse é um resultado possível e que muitos outros corredores já fizeram isso, vai ser mais fácil aceitar a situação caso ela ocorra com você.
Faça um plano: Avalie as diferentes consequências e decida como você irá lidar com cada uma delas. Se o joelho no qual você tem problema começar a doer na reta final, você vai seguir em frente se a dor for aceitável. Se começar a doer antes disso, você vai diminuir o ritmo.
Tenha um plano reserva: Se as coisas não saírem conforme o planejado, ter uma corrida alternativa planejada – um evento para o qual você possa mudar seu foco imediatamente – pode ajudar você a se recuperar da decepção em pouco tempo.
Aprenda com a experiência: Você não pode voltar no tempo, mas pode planejar o futuro. Revise o preparo para a competição: Você estava bem hidratado? Comeu pouco? Treinou adequadamente? Uma experiência ruim pode proporcionar lições valiosas.
Na Maratona de Boston de 2003, quase na metade do percurso, Dennis Fisher enfrentou um dilema. Cãibras nas pernas e cólicas haviam diminuído muito seu ritmo, interrompido por várias idas a banheiros químicos. Uma voz interna dizia para ele desistir e que aquele sofrimento não valia a pena. Mas, enquanto lutava para seguir em frente, pensava na instituição de caridade pela qual corria e nos e-mails que teria de enviar para explicar a “quebra” em sua quinta maratona. “Eu não queria desistir de jeito nenhum”, diz Fisher, jornalista de Massachusetts. “Naquele momento, desistir era um sinal de fraqueza.”
Fisher juntou forças e terminou a maratona em 4h40, uma hora a mais do que o tempo que planejava. Depois da competição, bebeu uma garrafa de água e, logo em seguida, vomitou. A esposa o levou ao pronto-socorro, onde ele recebeu tratamento para insuficiência renal. Dennis se recuperou, mas saiu do hospital com outra visão sobre a prova. “Ficou claro que eu deveria ter desistido”, afirmou.
Quando você depara com um contratempo no dia da competição – quer ele já esteja presente quando você acorda (enjoo, febre), quer apareça entre uma passada e outra (cãibras na panturrilha, torção no tornozelo) –, uma decisão precisa ser tomada. E, considerando que você tenha treinado intensamente e por muito tempo antes do evento, é provável que a decisão seja difícil. Se você desistir, terá de conviver com a dúvida de como teria se saído se tivesse continuado. Se abandonar a competição, pode evitar que um pequeno problema se transforme em algo mais sério.
De acordo com os médicos, as possíveis causas da insuficiência renal de Fisher foram a desidratação (clima quente, várias idas ao banheiro), o uso de anti-inflamatórios (usados antes da competição) e os 42 km percorridos. Se ele tivesse deixado a competição aos primeiros sintomas, talvez tivesse conseguido evitar a ida ao pronto-socorro. Aprender a entender os sinais do seu corpo pode ajudá-lo a saber quando insistir e quando desistir.
Diagnóstico na pista
Especialistas afirmam que é normal sentir algum desconforto ao fazer esforço e que, geralmente, você pode passar por isso sem se machucar ou correr risco de lesões. Uma dor que você já conhece provavelmente não é motivo para abandonar uma corrida, segundo Craig Moore, clínico geral especializado em medicina esportiva em Washington e maratonista com tempo de 2h19.
Se você tem tendinite no tendão de Aquiles, por exemplo, não é estranho que o calcanhar comece a doer no meio da prova. “Se você sentir uma dor incômoda e contínua, mas que não piora, normalmente você pode seguir em frente, especialmente se já estiver no fim da competição”, diz Moore.
Mas, se a dor for severa, inesperada ou diferente de qualquer dor que você já tenha sentido, então, esse é um sinal de alerta. “Se você sentir uma dor aguda, penetrante ou lancinante, você deve diminuir o ritmo para ver se ela para”, afirma Moore. Se isso não acontecer ou se ela aumentar, procure um posto médico ou espere até o atendimento chegar a você. Dor, pressão ou aperto no peito são sintomas que exigem atenção imediata. Além disso, se você sentir ou ouvir um estalo ou um estalido – sinais de estiramento do músculo ou do ligamento –, não dê mais nem um passo. Se parar na hora, você poderá se recuperar a tempo de participar de uma corrida “plano B” em poucas semanas (veja “Bola pra frente”, acima). Mas, se continuar correndo, poderá sofrer uma ruptura completa, o que pode significar meses sem correr e competir.
Lewis Maharam, diretor médico da Maratona de Nova York, afirma que a postura na corrida também pode dar indícios se é hora de desistir ou seguir. “Se a dor fica forte a ponto de alterar seu modo de correr – você favorece uma perna e tem dificuldade de aguentar o peso na outra ou está se curvando –, seu corpo está avisando que há algo errado”, afirma. Mas, antes de dizer adeus, tente ajustar o ritmo. “Se você estiver se matando para correr 1 km em 5 minutos, mas conseguir manter a postura e correr numa boa 1 km em 6 a 8 minutos, então deixe de lado seu tempo-alvo e pense em terminar a corrida”, diz Maharam. “Há uma diferença entre competir e correr em uma prova.”
Pense nas consequências
Se sua prioridade é correr em um tempo específico, então abandone o percurso se perceber que sua meta não poderá ser atingida e evite desperdiçar seu treino e desgastar o corpo em uma competição sem sentido. E, parando logo, você ainda pode tentar novamente na semana seguinte. Segundo Maharam, essa é a melhor saída também se você estiver enfrentando um resfriado, uma gripe ou lutando contra a feijoada que comeu antes da corrida – problemas que costumam se resolver sozinhos, em poucos dias. Se seu objetivo for curtir a prova, então uma boa estratégia é reduzir o ritmo e concentrar-se em alcançar a linha de chegada do modo mais confortável possível.
Às vezes, as coisas parecem ser piores do que realmente são. Escoriações, bolhas, cortes e arranhões podem até fazer você reduzir o ritmo, mas não precisam freá-lo. Em 2006, Teri Harper, do Colorado, lutou contra a bexiga cheia durante um percurso entre pedras e raízes de árvores na competição Barr Trail Mountain Race. “Estava procurando um lugar onde pudesse ir ao banheiro quando tropecei e caí”, diz ela. Se você cair, o conselho é simples. “Se você conseguir correr, corra”, afirma Terry Nicola, diretor de reabilitação em medicina esportiva da Universidade de Illinois. Qual é então a dificuldade? É definir o termo “correr”. “Mancar, andar com dificuldade ou se arrastando não é correr”, diz Nicola. Apesar de Teri ter ficado com os joelhos, os cotovelos e as palmas das mãos ensanguentados, ela não sofreu lesões importantes, conseguiu se recompor e conquistou uma medalha.
Quer você decida seguir em frente, quer resolva desistir, uma experiência frustrante em uma competição faz de você um corredor mais forte e mais sábio. Isso aconteceu com Fisher, que já correu duas maratonas desde o episódio traumático em Boston. “Aprendi que não há problema em diminuir o ritmo ou abandonar a prova se as coisas não vão bem”, afirma. “Mas também aprendi que posso continuar e cumprir as metas que estabeleci. Essa lição me ajuda em competições de curta distância, quando estou tentando estabelecer um recorde pessoal e parece impossível correr mais 1 quilômetro.”
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